Joaquim Pinto de Oliveira (TEBAS)
- ACR 113
- 2 de nov. de 2022
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Atualizado: 4 de nov. de 2022

História de Joaquim Pinto de Oliveira, conhecido como Tebas, um jovem negro Arquiteto na cidade de São Paulo na era escravocrata do séc. XVIII.
História
Joaquim Pinto de Oliveira, conhecido como Tebas, nasceu em Santos no ano de 1721. Tebas chegou a São Paulo, entre 1761 e 1763, próximo aos 41 anos de idade. O mesmo foi levado, ainda escravizado, por seu senhor, o português Bento de Oliveira Lima, um mestre pedreiro que viu na cidade uma oportunidade de trabalho, visto que naquela época, a região passava por um forte período de ascensão.
Tebas começou a mostrar sua habilidade em transformar pedras brutas em blocos de construção, o que era justamente parte do movimento de modernização da cidade. Naquela época, os prédios de São Paulo ainda eram construídos com a técnica de taipa de pilão que, embora fosse eficiente, trazia muitas limitações arquitetônicas em se tratando de ornamentação.
Com a morte de Bento de Oliveira Lima, em 1769, a senhora Maria Pinta teve de iniciar um processo de inventário para pagar as dívidas deixadas pelo ex-marido - que pareciam ser altas. Bento já havia sido remunerado por um serviço que viria a ser executado: a reforma da Catedral da Sé, a qual estava para ser concluída por Tebas (quem trabalhou de fato). Com isso, motivado por um arcebispo da Sé, Tebas entrou com uma ação contra a viúva entre 1777 e 1778, quando conseguiu sua alforria, aos 58 anos. A partir de então Tebas tornou-se mestre pedreiro – exercendo atividades similares a de um arquiteto - na cidade de São Paulo no Brasil Colonial. Somente em 2018 a profissão de Tebas foi reconhecida, quando o Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo (Sasp) o homenageou com base em documentos oficiais reunidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Sua destreza nesta arte transformou o pedreiro de ofício em um mestre pedreiro disputado, que influenciou significativamente a arquitetura paulistana.
Contratado por beneditinos, carmelitas e franciscanos, atuou nas fachadas frontais das igrejas da Ordem 3ª do Carmo das Chagas do Seráfico Pai São Francisco (Igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência), bem como nas do Mosteiro de São Bento e da Catedral da Sé.
Fatos a serem conhecidos:
Tebas morreu em 11 de janeiro de 1811, de gangrena, aos 90 anos e foi sepultado na Igreja de São Gonçalo, localizada na Praça João Mendes, centro de São Paulo. Sua história se tornou um samba escrito em 1974 pelo cantor e compositor Geraldo Filme um militante do movimento negro que reivindicava, já naquela época, a memória do construtor como figura fundadora da modernização de São Paulo, conta o pesquisador Carlos Gutierrez Cerqueira, pesquisador do IPHAN, em seu livro que reconstrói a memória e Tebas.
Tebas, negro escravo
Profissão: Alvenaria
Construiu a velha Sé
Em troca pela carta de alforria
Trinta mil ducados que lhe deu padre Justino
Tornou seu sonho realidade
Daí surgiu a velha Sé
Que hoje é o marco zero da cidade
Exalto no cantar de minha gente
A sua lenda, seu passado, seu presente
Praça que nasceu do ideal
E braço escravo
É praça do povo Velho relógio, encontro dos namorados
Me lembro ainda do bondinho de tostão
Engraxate batendo a lata de graxa
E camelô fazendo pregão
O tira-teima do sambista do passado
Bixiga, Barra Funda e Lava-Pés
O jogo da tiririca era formado
O ruim caía e o bom ficava de pé
No meu São Paulo, oi lelê, era moda
Vamos na Sé que hoje tem samba de roda.
Foi descrito no site Brasiliana Fotográfica de esta maneira: “Essencial para a renovação do estilo arquitetônico da cidade de São Paulo no século XVIII, foi o mais afamado oficial de cantaria de pedra, técnica de talhar pedras em formas geométricas, e era também mestre nas técnicas de alvenaria e hidráulica. Apesar da importância de seu legado, só foi reconhecido como arquiteto, em 2018, quando foi inserido no quadro associativo do Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo. Era dado, então, mais um passo para acabar com a invisibilidade da trajetória desse importante personagem da história de São Paulo e do Brasil.”
De acordo com o CAU do Rio Grande do Sul: “Apesar de o apelido “Tebas” ser popular, ele tem origem incerta. Uma das versões sugere que a alcunha se relacione com a Tebas grega, enquanto outra afirma que ela venha de uma palavra do quimbundo, língua africana da família banta, usada para definir alguém com grande habilidade. O jornalista Abílio Ferreira, organizador do livro “Tebas: um negro arquiteto na São Paulo escravocrata”, aposta na segunda hipótese. “É bem mais provável que o povo do século XVIII conhecesse essa palavra de sua língua ancestral do que a lenda grega do Sófocles”.
O livro é uma das principais fontes sobre a história do arquiteto, que trabalhou até os 90 anos e só conseguiu se livrar da escravidão aos 58, quando conquistou sua alforria. Apesar de seus feitos serem a parte mais importante da sua história como profissional, o livro também ressalta que infelizmente, em muito do que se fala sobre Tebas, a sua situação de escravizado vem à frente de suas habilidades profissionais únicas.
Alguns dos trabalhos realizados por TEBAS:
Como descrito no site Viva Decora: “As contribuições de Tebas para a arquitetura paulistana estão principalmente nas igrejas. Assim como sempre aconteceu na maior parte da história, eram as ordens religiosas que tinham mais recursos para investir no desenvolvimento da arquitetura. Entre as obras mais famosas de Tebas estão a construção da torre da antiga Igreja Matriz da Sé e os projetos das fachadas do Mosteiro de São Bento e da Igreja das Chagas do Seráfico Pai São Francisco.”-
REFORMA DO FRONTISPICIO E CONSTRUÇÃO DA TORRE DA IGREJA DA SÉ
A igreja foi projetada e construída por Luis Ávares e Domingos Luís na cidade de São Paulo, tendo sido finalizada por volta de 1612. Antes da reforma a edificação não possuía torre.150 anos após sua construção, um bispado foi criado na cidade e a Igreja foi reformada para que sua aparência fosse compatível com uma Sede Episcopal.

Desenho: Mateus Rosada, 2014

Desenho: Mateus Rosada, 2014

Desenho: Mateus Rosada, 2014
Dadas as suas habilidades em trabalhar com pedra lavrada, Tebas foi o responsável pela reforma. O frontispício era de aparência tipicamente colonial, executado em pedra de cantaria com três janelas e uma torre que possuía cerca de o dobro da altura do pé direito da nave. A torre ficava do lado direito, tinha uma quarta janela e um relógio. A sacristia ficava do lado esquerdo.

Desenho: Mateus Rosada, 2014
O frontispício da Sé foi a primeira grande obra de Tebas. Não há registro de outros profissionais com capacidade para tal tipo de trabalho na cidade na época. Com o crescimento e mudança de estilo de vida da cidade entre o fim do século XIX e o início do século XX, as edificações coloniais foram substituídas e a Igreja da Sé foi demolida nesse processo.
REFORMA DA FACHADA DA ORDEM TERCEIRA DO CARMO
Tebas teve participação na fachada da igreja da Ordem Terceira do Carmo (1775 – 1776). Depois, a igreja sofreu uma grande reforma na década de 1920. Todas as paredes mais finas da planta são dessa reforma, projeto de Ricardo Severo. Na fachada, obra de Tebas, Severo alterou apenas o óculo (era redondo, ficou com forma diferente disso).

Planta da Igreja da Ordem Terceira do Carmo
Desenho: Raul Hirch, 2020

Fachada da Ordem Terceira do Carmo em 1854
Casa Vogue, 2020

Fachada da Ordem Terceira do Carmo em 1920
Casa Vogue, 2020

Fachada da Ordem Terceira do Carmo em 2020
Foto de Abilio Ferreira - Casa Vogue, 2020
CONSTRUÇÃO E POSSÍVEL ALTERAÇÃO DO MOSTEIRO DE SÃO BENTO
A planta do Mosteiro de São Bento é um projeto do engenheiro José Custódio de Sá e Faria. Apesar de só ter construído, era comum que os empreiteiros da época fizessem alterações no projeto. Assim, há elementos da obra que foram escolhidos por Tebas. Como citado no livro “Tebas, um negro arquiteto na São Paulo Escravocrata”, o mosteiro de São Bento pagou a Tebas, em 1766, seis tostões pela pedra fundamental da fachada da igreja. Esse cubo de pedra, pertencente ao museu do mosteiro, foi encontrado em 1911, quando ocorreu a demolição da antiga fachada. Fachada do Mosteiro de São Bento

Pedra fundamental da fachada da Igreja de São Bento
Foto de autor desconhecido
Tebas “lavrou também a portaria de pedra da igreja, encimada por um frontão em forma de concha. Por todo o trabalho de cantaria lavrada – portada principal, três janelas do coro e cruz romana de remate da fachada – recebeu ele do mosteiro, no mesmo ano de 1766, a quantia de 286 $040 réis.”

Planta do Mosteiro de São Bento
Desenho: Raul Hirch, 2020
CONCLUSÃO
Os feitos de Tebas foram tão impressionantes que levaram seu nome a ser usado como elogio para pessoas habilidosas. Por sua história de vida e por suas excepcionais habilidades profissionais, o arquiteto figura entre os mais importantes personagens da história da arquitetura brasileira. Com o devido reconhecimento enquanto arquiteto, seu nome será conhecido e lembrado e sua importância ressaltada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ferreira, Abilio; Cerqueira, Carlos Gutierrez; Young, Emma; Jacino, Ramatis; Chiaretti, Maurilio Ribeiro. Tebas - Um negro arquiteto na São Paulo Escravocrata. São Paulo: IDEA, 2018. 128 p. ISBN 978-65-80005-01-7
Conheca a História de Tebas, o arquiteto que esculpiu ícones de São Paulo;
Acesso em: Outubro de 2022
Inaugurada em São Paulo a estátua de Tebas, arquiteto escravizado no seculo XVIII;
Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/952117/inaugurada-em-sao-paulo-a-estatua-de-tebas-arquiteto-escravizado-no-seculo-xviii
Acesso em: Outubro de 2022
Tebas, o negro escravizado que marcou a arquitetura de São Paulo;
Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2020-06-30/tebas-o-arquiteto-escravizado-que-marcou-a-arquitetura-de-sao-paulo.html
Acesso em: Outubro de 2022
Quem foi Tebas, escravo que virou arquiteto em meio ao Brasil colonial;
Disponível em: https://www.geledes.org.br/quem-foi-tebas-escravo-que-virou-arquiteto-em-meio-ao-brasil-colonial/
Acesso em: Outubro de 2022
Arquiteto Tebas: A história do homem escravizado que marcou a arquitetura;
Disponível em: https://www.vivadecora.com.br/pro/arquiteto-tebas/
Acesso em: Outubro de 2022
São Paulo homenageia Tebas, o escravo que virou arquiteto no século 18:
Disponível em: https://vermelho.org.br/prosa-poesia-arte/sao-paulo-homenageia-tebas-o-escravo-que-virou-arquiteto-no-seculo-18/
Acesso em: Outubro de 2022
Mosteiro de São Bento de São Paulo;
Acesso em: Outubro de 2022
Um arquiteto negro na São Paulo escravocrata;
Disponível em: https://outraspalavras.net/cidadesemtranse/um-arquiteto-negro-na-sao-paulo-escravocrata/
Acesso em: Outubro de 2022
Entrevista com Geraldo filho;
Acesso em: Outubro de 2022




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